Porque amar dá trabalho, como já se disse tanto? Será que não conseguimos, também no amor, dar um jeitinho?... Parece que ele nos implica de todo, fazendo com que o que mais sonhamos obter por sua via possa, em um instante, se tornar um mar de tormentos e ansiedades que nos paralisam.
Porque algo que imaginamos tão bom pode afligir tanto?
Talvez algumas significações possíveis para a palavra ansiedade possam pavimentar um pouco o caminho de nossa reflexão.
Podemos pensar em ansiedade no sentido de um “ansiar por algo”, buscar algo na relação com alguém. Podemos também lembrar um outro sentido na raiz da palavra ansiedade, que é a “ânsia de algo”, o que nos causa uma espécie de reação de repulsa e expulsão.
Se esses dois sentidos da palavra possam parecer antagônicos, no que diz respeito à sua dimensão semântica, podemos suspeitar certamente que no que tange à experiência amorosa tais antagonismos são vividos de maneira bastante ambígua.
De fato, na medida em que no amor o conjunto de mitos que fundam nossa subjetividade se repõe na relação com o outro amado, o que se coloca para o amante é o enfrentamento, no acontecer da experiência amorosa, de toda uma gama de conflitos, impasses, frustrações, buscas, expectativas, dentre muitas outras experiências psíquicas de si. No amor, o si-mesmo se desconhece, para no encontro com a diferença do outro amado vir a descobrir e realizar outras dimensões de si.
Esta experiência não se dá sem conflitos, porque a experiência de aspectos de si desconhecidos no acontecer do amor coloca as certezas do sujeito sobre si-mesmo em jogo. Assim, amar é um exercício de colocar em suspenso muitas de nossas crenças narcísicas sobre nós mesmos, pela promessa de descobrir e experimentar outras “coisas” de si que podem oferecer novos amparos para nossa imagem própria...
No amor, desta forma, podemos nos defrontar com aspectos que nos causam ânsia, que buscamos não reconhecer como nossos, expulsar de nossa responsabilização, no exercício máximo do aprendizado de si que é a sustentação do enigma que é sempre nosso “si-mesmo”, posto pela relação amante-amado.
O que mais ansiamos por, o que mais buscamos viver, o amor, pode ser assim também o passaporte para o enfrentamento do que não nos permite suportar sua própria realização, nossa incapacidade de suportar o enigma do que nos constitui enquanto sujeitos humanos, qual seja nossa diferença intrínseca em relação a nós mesmos.
Suportar disparidades em si, de si, faculta ao amante a experiência do que o romance de Milan Kundera coloca como a insustentável leveza do ser, leveza que pesa, porque não passível de ser circunscrita e delimitada em certezas de si.
Você está à altura dos seus sonhos de amor? Pode suportar as questões que ele coloca sobre si, na vivência dos enigmas de si, pela incapacidade de obter respostas que te ofereçam pilares sólidos que possam esgotar o que pode ver de si e garantam sua tranqüilidade?